Engenheiros acharam milhares de fissuras na hidroelétrica Coca Codo Sinclair causadas pela má qualidade do aço chinês |
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de política internacional, sócio do IPCO, webmaster de diversos blogs |
A hidrelétrica Coca Codo Sinclair foi construída pela China perto de um vulcão em atividade. Trouxe grande popularidade ao ditador chavista Rafael Correa, significou uma forte entrada do comunismo de Pequim no país andino e paliou a crise energética, ao menos passageiramente.
Foi o maior projeto de infraestrutura já realizado no Equador, um colosso de concreto financiado com dinheiro chinês e é tão importante para Pequim que o líder da China, Xi Jinping, falou na inauguração em 2016, constatou “La Nación”.
Hoje, milhares de rachaduras aparecem na hidrelétrica de US$ 2,7 bilhões, disseram engenheiros do governo. Ao mesmo tempo, as encostas montanhosas do rio Coca estão sendo erodidas pelo caudaloso rio, cortando uma estrada e ficando ameaçada a integridade da barragem.
As falhas de planificação e execução alimentam a preocupação de que a maior fonte de energia do Equador possa vir abaixo.
“Podemos perder tudo”, disse Fabricio Yépez, engenheiro da Universidade de San Francisco, em Quito, que acompanha de perto os problemas do projeto. “Não sabemos se pode ser amanhã ou daqui a seis meses.”
É um dos muitos projetos financiados pela China em todo o mundo atormentados por falhas de construção, mostrou densa reportagem do “Wall Street Journal”.
Durante a última década, a China distribuiu um trilhão de dólares em empréstimos internacionais como parte da iniciativa Rota da Seda, destinada a desenvolver o comércio expandindo a ânsia de hegemonia da China na Ásia, África e América Latina.
Esses empréstimos fizeram de Pequim o governo mais credor para o mundo em desenvolvimento, com empréstimos quase equivalentes aos de todos os outros governos juntos, de acordo com o Banco Mundial.
Erosão do rio Coca pela má planificação chinesa da barragem Coca Codo Sinclair |
Alguns projetos também resultaram incompatíveis com as necessidades de infraestrutura de um país ou prejudiciais ao meio ambiente.
A construção de baixa qualidade pode prejudicar a infraestrutura principal e sobrecarregar as nações com ainda mais custos nos próximos anos, em lugar de remediar os problemas.
“Estamos sofrendo hoje por causa da má qualidade de equipamentos e peças” em projetos construídos na China, disse René Ortiz, ex-ministro de Energia do Equador e ex-secretário-geral da Organização dos Países Exportadores de Petróleo.
A Embaixada da China no Equador não respondeu aos pedidos de comentários sobre o projeto hidrelétrico.
O dinheiro chinês foi usado para construir de tudo, desde um porto no Paquistão até estradas na Etiópia e uma linha de transmissão no Brasil.
As empresas de construção chinesas se apoiam em combinações ideológicas com autoridades locais prometendo pacotes de financiamento de bancos e seguradoras chineses, por vezes irrigando com dinheiro bolsos particulares.
Na África, mais de 60% da receita dos principais contratos em 2019 foram para empresas chinesas, de acordo com um artigo de 2021 da Iniciativa de Pesquisa China-África da Universidade Johns Hopkins.
Em pouco tempo, vieram à tona graves falhas em alguns dos projetos.
O Paquistão fechou a hidrelétrica Neelum-Jhelum feita por chineses por perigo de desabamento detectado |
O chefe do regulador de eletricidade do país, Tauseef Farooqui, disse ao Senado do Paquistão que estava preocupado com o colapso do túnel apenas quatro anos depois que a usina de 969 megawatts entrou em operação.
O fechamento da usina já custou ao Paquistão cerca de US$ 44 milhões por mês em custos de energia, de acordo com o órgão regulador.
A empresa de geração de energia de Uganda identificou mais de 500 defeitos de construção em uma usina hidrelétrica de 183 megawatts construída pela China no rio Nilo, que gerou quebras frequentes desde que entrou em operação em 2019.
O Projeto de Energia Hidrelétrica Karuma de 600 megawatts no Nilo, também na Uganda, está três anos atrasada por defeitos de construção, incluindo paredes rachadas.
A empreiteira chinesa Sinohydro Corp., instalou cabos, interruptores e um sistema de extinção de incêndio defeituosos.
A China International Water & Electric Corp., que liderou construção da Usina Hidrelétrica de Isimba, falhou em construir uma barreira flutuante para proteger a represa de ervas daninhas e outros detritos, o que levou a turbinas entupidas e falta de energia, de acordo com a Uganda Electricity Generation Co., ou UEGC.
Em Angola, 10 anos depois que os primeiros inquilinos se mudaram para o Kilamba Kiaxi, um vasto projeto de habitação social fora da capital Luanda, muitos reclamam de paredes rachadas, tetos mofados e construção precária.
O projeto foi construído pelo CITIC Group da China.
“O nosso prédio tem muitas fissuras”, disse Aida Francisco, que vive num apartamento de quatro quartos no Kilamba com o marido e três filhos.
Uganda identificou defeitos graves na hidrelétrica Isimba (na foto em construção) |
Nos últimos anos muitos edifícios, incluindo o dela, caíram em desuso.
“Esses prédios não vão durar muito”, disse dona Francisco. “Eles estão desmoronando pouco a pouco.”
Na pobre província de Jujuy, no norte da Argentina, a PowerChina construiu o parque solar Cauchari, o maior projeto do gênero na América do Sul. A mais de 13.000 pés acima do nível do mar, é capaz de abastecer cerca de 160.000 residências, de acordo com o governo argentino.
No Brasil, a State Grid da China construiu uma das linhas de transmissão mais longas do mundo, conectando a barragem de Belo Monte, no Nordeste, a cidades do sul, a cerca de 1.550 milhas de distância.
No Equador parlamentares, ex-ministros e ativistas anticorrupção dizem que os empréstimos carecem de transparência, os contratos foram concedidos sem licitações públicas, resultando em construção de má qualidade, altos custos e corrupção.
Funcionários do governo atual e economistas equatorianos disseram que alguns projetos fazem pouco sentido, incluindo a expropriação de milhares de acres de terras agrícolas em um vale andino para construir uma nova metrópole chamada Yachay City, que deveria transformar o Equador em uma potência tecnológica regional.
O Export-Import Bank of China forneceu um empréstimo de US$ 200 milhões para as primeiras obras de infraestrutura. Hoje, o projeto foi abandonado, com um supercomputador de $ 6,3 milhões inutilizado, mas que deveria ser usado por pesquisadores sentados ao ar livre.
Em 2019, a controladoria-geral revisou a construção de 200 escolas feitas pelos chineses, relatando que alguns dos prédios apresentavam problemas nas fundações e outros tinham salas de aula com piso inclinado e cabos expostos. Cinquenta e sete das escolas foram concluídas com atraso, disse o escritório do controlador geral.
“Correa gastou em muitos projetos que não eram adequados”, disse Vicente Albornoz, economista da Universidade de Las Américas em Quito. “E a China estava financiando os gastos de Correa [nos projetos].”
O ex-presidente esquerdista Correa disse que o dinheiro impulsionou o desenvolvimento com novas rodovias, hospitais e escolas, mas foi condenado em 2020 por corrupção e está exilado na Bélgica.
A família Carranza salvou tudo o que pode temendo o desabamento da usina chinesa |
Em 2020, as encostas do rio Coca começaram a desmoronar sacudindo o solo como um terremoto. A erosão destruiu a maior cachoeira do Equador, uma estrada importante e um oleoduto.
O Pink House, um bordel em San Luis que os moradores dizem ser popular entre os trabalhadores chineses e equatorianos, caiu no rio.
Temendo pela segurança de sua família, a Sra. Carranza fugiu de San Luis em março, salvando tudo o que pôde de sua casa, tirando janelas, portas e até mesmo o telhado.
O governo precisará realocar uma parte importante da usina o que custaria milhões de dólares, antes que a estrutura seja destruída pela erosão.
Nancy Chicaiza, moradora de San Luis, tem poucas esperanças de sobrevivência de sua cidade, e acha que a erosão acabará por destruir toda San Luis. “A Coca Codo foi considerada muito boa. Ninguém pensou nessas consequências”, disse Chicaiza