|
Kangbashi: não e filme fiction mas é mais uma cidade fantasma da China |
|
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs
|
É uma cidade fantasma, mas não é um cenário de novela. Está despovoada, mas não é uma cidade como as da Antiguidade.
Kangbashi, na Mongólia Interior, norte da China, pode dar moradia a um milhão de habitantes, más nela só há 50.000 pessoas, noticiou “La Nación” de Buenos Aires.
É um cidade brilhante pela sua modernidade. Milagre da planificação socialista, ela possui largas avenidas, enormes prédios, parques impecáveis e gigantescos shoppings, além de um museu e uma pista de corrida de carros ‘novinha em folha’.
Só que não tem gente.
Kangbashi está no meio das estepes da Mongólia, a 23 km de Dongsheng, capital de Ordos, uma das 12 zonas da região.
O problema foi a sua má planificação. Ela é até um símbolo do erro crasso de se pretender fazer uma urbanização planificada, nos moldes que os Planos Diretores esquerdistas no Brasil tentam a seu modo imitar.
O pesadelo começou assim: na região de Ordos foram descobertas jazidas de carvão, gás natural e “terras raras”. A partir dali começaram as elucubrações cerebrinas de uma futura metrópole invejável. A iniciativa privada foi banida de vez.
A abissal diferença entre o cálculo e o produto final não pode ser reconhecida, sob pena de crime contra a sabedoria dos dirigentes totalitários do PC.
|
Kangbashi: o asfalto já esta rachando mas os carros não passam |
Mais ainda, o responsável pelas relações públicas da cidade fantasma, Chai Jiliang, sublinhou no jornal oficial China Daily que o absurdo descompasso faz parte de um plano estratégico! Plano esse que ele obviamente não explicou, estratégia que nem sequer disse no que consiste.
Desde 2013 a China construiu por volta de 20 cidades e distritos fantasmas.
No passado, a criação por Deng Xiao Ping de “Zonas Econômicas Especiais” favoreceu a instalação de fábricas de empresas capitalistas privadas e a aparição de gigantescos centros urbanos exportadores e importadores.
Shenzhen e Pudong, em Xangai e Zhengdou, são exemplos.
Mas a bonança econômica internacional já não está para isso. Capitais e indústrias até estão saindo da China.
Mas o Partido precisava exibir resultados econômicos fulgurantes, inclusive em plena recessão planetária, para justificar a crescente projeção chinesa no mundo todo.
Então as cidades fantasmas encheram os números do PIB, obedecendo às dogmáticas indicações do poder central. Mas já não dá mais, como disse Gary Liu, diretor executivo do Instituto Internacional Lujiazui, ao jornal espanhol El País.
As vendas imobiliárias caíram mais de 10% entre janeiro e maio deste ano em 71 das 100 cidades acompanhadas pelo Sistema de Índice Imobiliário da China. Só em Pequim a queda foi de 34,8%.
Fiel a seu infalível dirigismo, o socialismo anunciou um “Novo Plano de Urbanização Nacional 2014-2020” que custará US$7 bilhões.
|
Kangbashi: a cidade que não nasceu mas já tem seu museu |
Imperturbável em face do naufrágio deste “Titanic” de dimensões continentais, o governo anunciou que a urbanização artificial prosseguirá, porque “é um poderoso motor para o crescimento econômico num ritmo sustentável”. O slogan soa lindo aos ouvidos ambientalistas, mas não por isso o plano de urbanização é menos insustentável.
Haverá, pois, mais cidades e distritos fantasmas. Nelas, os exíguos habitantes como os de Kangbashi usufruem de benefícios exclusivos como ônibus grátis (poderíamos enviar muitos desordeiros brasileiros para fazer experiência lá), impostos quase zero e serviços subsidiados.
Algum dia a verdade baterá à porta e o desastre ficará exposto a todos os ventos. E isso talvez aconteça antes mesmo de esses fantasmas de cimento terem sido completados. Como Babel há alguns milênios atrás...